A tal da moedinha.

        Nosso comércio vem sofrendo com a falta de moedas para o troco. Um problema maior do que pode parecer à primeira vista. Transtornos entre comerciantes e clientes, prejuízos que se acumulam para quem arredonda em favor do cliente, mal estar para quem arredonda em seu próprio favor, dificuldade para utilizar certos equipamentos como as máquinas de café cada vez mais comuns, enfim: um problema que só não é maior porque nossa tradição no uso de moedas nunca foi muito grande. Nossos telefones públicos, por exemplo, usam hoje cartões magnéticos mas antigamente já eram fichas telefônicas, não moedas.

        O Banco Central reconhece a falta de moedas, desculpa-se alegando falta de recursos para produzi-las e apresenta uma defesa: o público não coopera, deixando as moedas em casa, jogadas em um canto. Se os brasileiros, alega o Banco Central, utilizassem mais as moedas de que dispõem, a falta seria menor.

        Vamos olhar isso mais de perto. É verdade que, quando nossas grandes metrópoles se desenvolveram, o papel-moeda já estava estabelecido. Também é verdade que anos de inflação alta desestimularam o uso de moedas, mais caras e duráveis que o papel, exatamente o oposto do que fazia sentido naquele tempo de dinheiro efêmero. Mas... será que é só isso que explica o baixo uso? Que tal olharmos um pouquinho para os países que utilizam mais a moeda?

        Um país onde o uso de moedas é forte é a Alemanha. Lá as pessoas não desprezam as moedinhas, mas nem dá para desprezar: a maior delas, de dez marcos, vale algo como quatorze reais! Nada que se compare com o máximo de um real que a moeda brasileira pode valer. Esse parece um caminho improvável aqui, onde por tradição as moedas representam frações do dinheiro de papel, condenadas a serem, por definição, pouco valiosas.

        Tomemos então outro exemplo: os Estados Unidos. Parece mais apropriado, já que é um país novo como o Brasil e também lá as moedas representam o dinheiro fracionário, o troco. Também aqui somamos diferenças, como a inflação sempre baixa e a cultura anglo saxônica, mais rigorosa e detalhista. Mas há também uma diferença sutil nas moedas, algo que nunca aprendemos a fazer: simplicidade e constância. O sistema americano possui apenas quatro moedas. Isso mesmo, quatro: de um, cinco, dez e vinte e cinco centavos respectivamente. Simples, não é? E eficaz: a divisão é suficientemente grande para que poucos valores peçam mais que três ou quatro moedas. A baixa quantidade de moedas também permite que equipamentos como telefones públicos e máquinas de jornal ou café “conheçam” cada uma. Você pode ter poucas moedas e ainda assim elas serão úteis para os pagamentos que você precisa fazer.

        E no Brasil? Nosso sistema prevê seis moedas. Na verdade, doze, porque temos dois sistemas em paralelo! Valores iguais, utilidades diferentes. Procure utilizar uma moeda nova de cinqüenta centavos em uma dessas máquinas automáticas de café e você entenderá o que eu digo. Até que procuro seguir a orientação do Governo, levo as moedinhas comigo no bolso apenas para voltar para casa com elas e mais algumas de troco.

        A justificativa para o segundo sistema de moedas eram as confusões provocadas pelo primeiro: moedas muito parecidas em tamanho e forma, dificultando a diferenciação. Se isso era verdade, um sistema deveria substituir o outro, não é? Pois a antiga confusão continua, agora agravada pela presença de outro sistema em paralelo com o primeiro. A única mensagem que consigo extrair disso é a de um sistema provisório, feito para não durar, para ser substituído como nos velhos tempos da inflação. E não é só: nossa moeda de um real, já em duplicidade, tem ainda um parceiro em papel. São três alternativas diferentes para a mesma coisa. Agora, o Banco Central anuncia que o sistema crescerá para treze moedas, pois será introduzida a de dois reais, devidamente acompanhada por uma redundante cédula no mesmo valor...

        Será que o Banco Central possui mesmo poucos recursos para as moedas ou apenas está utilizando muito mal o dinheiro do contribuinte? Fico aqui me perguntando se, com um sisteminha simples de quatro e apenas quatro moedinhas o dinheiro estaria faltando.

        Deixo a resposta para os técnicos do nosso Banco Central, que devem entender disso mais que eu!